Oncologia - Protocolo de Extravasamento de Quimioterapia (versão 1)

Todas Áreas

Padronizar intervenções para prevenção de extravasamento de quimioterápicos, e medidas a serem instituídas rapidamente na ocorrência desse, visando minimizar o desenvolvimento de lesões graves.

Aila Mabla Azarias - farmacêutica da Farmácia de Quimioterapia do HCFMRP-USP
Andréia Ferreira Zombrilli - enfermeira chefe da Enfermaria de Hematologia do HCFMRP-USP
Flávia Angulo G. Pavan - enfermeira chefe substituta da Central de Quimioterapia do HCFMRP-USP
Flávia F. Luchetti Rodrigues - enfermeira chefe da Enfermaria de Oncologia Clínica do HCFMRP-USP
Prof. Dr. Leandro Machado Colli - docente chefe do Serviço de Oncologia Clínica do HCFMRP-USP
Dra. Liane Rapatoni - coordenadora técnica da Seção de Quimioterapia do HCFMRP-USP
Nathalia Maria Padilha - enfermeira chefe da Central de Quimioterapia do HCFMRP-USP
Rodrigo Marangoni Fernandes - farmacêutico coordenador da Farmácia de Quimioterapia do HCFMRP-USP
Dra. Tatiane Cardoso Motta - oncologista clínica do Serviço de Oncologia Clínica do HCFMRP-USP

Data da última alteração: sexta, 01 de outubro de 2021
Data de validade da versão: domingo, 01 de outubro de 2023

Extravasamento é definido como o escape acidental de drogas do vaso sanguíneo para os tecidos adjacentes, e é considerado uma complicação grave da administração de quimioterapia.

O diagnóstico é clínico, observado durante a infusão de quimioterapia:
● Redução ou parada do fluxo da infusão;
● Resistência à infusão;
● Dor;
● Queimação;
● Sensação de agulhada;
● Edema;
● Eritema;
● Redução ou interrupção do retorno venoso.

Não são necessários exames complementares no extravasamento de quimioterápicos infundidos em acesso venoso periférico. Nos casos de extravasamento em acesso central, solicitar radiografia de tórax imediatamente e tomografia de tórax tão logo seja possível, para avaliação do trajeto do cateter e dimensão do conteúdo extravasado.

1. Cuidados básicos fundamentais para prevenir o extravasamento:
● Capacitar equipe de enfermagem periodicamente para administração segura dos quimioterápicos;
● Selecionar o acesso venoso adequado ao tipo de infusão e drogas prescritas, condições clínicas e rede venosa do paciente;
● Na seleção de veias para acesso venoso periférico, dar preferência a seguinte ordem: veias do antebraço, seguida de dorso da mão e punho (devendo ser evitado o dorso da mão e punho devido a pouca quantidade de tecido nessas regiões, o que pode ocasionar maior dano nos casos de extravasamento). Não administrar quimioterápicos em membros inferiores, com linfedema, edemaciado, com alterações de motricidade ou sensibilidade;
● Não puncionar veias sobre articulações, em áreas irradiadas, com lesões ou metástases, ou em locais excessivamente puncionados e não utilizar veias puncionadas há mais de 24 horas;
● Escolher o dispositivo para punção venosa de menor calibre (22G ou 24G);
● Fixar o dispositivo com filme estéril transparente e ficar atento à fixação adequada, a fim de evitar tracionamento do cateter venoso;
● Evitar “tapinhas” sobre a veia, pois além de dolorosos podem lesionar o vaso;
● Não realizar infusão prolongada de drogas vesicantes por veia periférica. Em geral, as drogas vesicantes são administradas em bolus ou infusão rápida. Se infusão em tempo superior a 1 hora, recomenda-se a implantação do cateter central;
● Certificar-se do posicionamento correto do cateter antes de infundir o quimioterápico: administrar flush de soro fisiológico 0,9%, monitorar fluxo, testar retorno venoso a intervalos regulares, observar edema, hiperemia e queixas do paciente;
● Orientar paciente e acompanhante quanto aos sinais e sintomas de extravasamento como: dor, queimação, formigamento, prurido, desconforto, ardência ou agulhada;
● Manter vigilância constante e avaliar sinais de extravasamento;
● Priorizar a infusão de drogas vesicantes antes das não vesicantes;
● Infundir pelo menos 20 ml de soro fisiológico 0,9% ao término da infusão da quimioterapia.

2.. O que devo fazer quando extravasar?
● Parar imediatamente a infusão da droga e manter a agulha no local de punção;
● Conectar uma seringa ao dispositivo e aspirar a medicação residual e se possível, parte da extravasada;
● Remover o cateter e elevar o membro acima do nível do coração;
● Não realizar pressão manual direta na área afetada (evitar distribuição da medicação para o tecido adjacente);
● Nos casos de acesso venoso central: salinizar o acesso e não retirar a punção (agulha); solicitar radiografia de tórax imediatamente e tomografia de tórax tão logo seja possível, para avaliação do trajeto do cateter e dimensão do conteúdo extravasado;
● Notificar o médico responsável pelo paciente;
● Administrar o protocolo de compressa local e/ou uso de antídotos conforme descritos a seguir;
● Manter um kit de emergência para extravasamento, de fácil acesso em local previamente estabelecido pela instituição, contendo, no mínimo:
❖ luvas de procedimentos
❖ avental de baixa permeabilidade
❖ máscara com carvão ativado
❖ óculos de proteção
❖ seringa, agulha (13x4,5), ampola de SF 0,9%
❖ antídotos padronizados (hialuronidase, DMSO, bicarbonato de sódio 8,4% e dexametasona injetável 4mg/ml)
❖ gaze estéril
❖ compressas absorventes
❖ recipiente identificado para recolhimento dos resíduos se houver
❖ Os kits serão armazenados na Central de Quimioterapia (2o andar, ambulatório, ramal 2389) e Enfermaria de Oncologia Clínica (7o andar, ramal 2572);
● Fotografar o local do evento adverso, mediante autorização do paciente ou família, e anexar em prontuário eletrônico do paciente (PEP) (PO);
● Registrar a ocorrência em Formulário Institucional no PEP - Assistência de Enfermagem no Extravasamento de Quimioterapia; contendo data, hora, tipo de dispositivo e calibre, local, drogas administradas, quantidade extravasada, sinais e sintomas apresentados, tratamento realizado;
● Notificar o Gerenciamento de Risco da Instituição;
● Estabelecer um plano de acompanhamento e cuidados para a internação ou domicílio, orientar ao paciente;
● Realizar plano de alta, que pode incluir contato telefônico para acompanhamento do evento adverso.

3. Plano de alta e acompanhamento dos extravasamentos
O planejamento da alta é a parte final do plano terapêutico, e um ponto crucial no desfecho do paciente com extravasamento. O plano de alta deve garantir que a mesma qualidade dos cuidados assistenciais que foram prestados no ambiente hospitalar, sejam continuados no ambiente ambulatorial e no domicílio do paciente, a fim de se evitar a re-hospitalização9.
As orientações para tratamento no domicílio devem ser reforçadas, e um plano de cuidados por escrito deve ser entregue ao paciente. No que se refere a periodicidade de acompanhamento, sugerimos:
Drogas Irritantes: Realizar avaliação no 2º e 7º dia após o evento (via telefone), avaliar necessidade de seguimento e consulta presencial;
Drogas Vesicantes: Realizar avaliação no 2º, 7º e 10º dia após o evento (sendo preferencialmente a primeira avaliação presencial, e as demais via telefone), avaliar necessidade de seguimento.


4. Utilização de compressas e antídotos (Vide tabela 2)
4.1. Como utilizar as compressas morna e fria?
A aplicação de compressa morna deverá ser realizada durante 15-20 minutos, 4 vezes por dia, durante 48 horas somente para quimioterapias classificadas como alcalóides da vinca e etoposido. O mecanismo de ação é facilitar o aumento da absorção e distribuição do citostático, através da vasodilatação.
As compressas frias deverão ser colocadas nos extravasamentos por antraciclinas, antibióticos tumorais e agentes alquilantes. Os pacientes devem ser orientados a colocarem bolsa de gelo ou compressa fria por 15-20 minutos, 4 vezes ao dia, por 48 horas. O mecanismo de ação é baseado na vasoconstrição, com a diminuição da velocidade de infusão da droga nos tecidos, diminuindo a área de danos.
Nos casos de extravasamento por oxaliplatina, o uso de compressas não é recomendado. Preconiza-se o tratamento sistêmico com dexametasona 8mg, via oral, duas vezes ao dia, por 14 dias.

4.2 Como utilizar os antídotos? (Vide tabela 3)
Os antídotos locais devem ser administrados imediatamente após a identificação ou suspeita de extravasamento. O objetivo é limitar o processo de inflamação local, inativar a droga remanescente e removê-la rapidamente do local. Seu uso deve ser prescrito pelo médico.
São descritos na literatura, referência de cinco antídotos indicados para alguns grupos de drogas: Dexrazoxane; Hialuronidase; Dimetilsulfóxido (DMSO); Tiossulfato de sódio; Hidrocortisona subcutânea e Betametasona tópica.
Todavia, após ampla revisão de evidências científicas e discussão com especialistas locais, padronizou-se para esta instituição: Hialuronidase; Dimetilsulfóxido (DMSO), Bicarbonato de sódio 8,4% e Dexametasona.

a) Alcalóides de vinca e taxanos
(Vincristina, Vimblastina, Vinorelbine e Paclitaxel)
Antídoto: Hialuronidase 400 UI/ml
Ação: Degradação do ácido hialurônico, aumentando a difusão da droga nos tecidos, aumentando a permeabilidade celular e reduzindo área de lesão.
Preparo e administração: em uma seringa de 10ml preparar: 250 UI de hialuronidase, diluída em 6 ml de SF 0,9%, dividido em 5-6 injeções subcutâneas (agulha 13 x 4,5) em torno do local de extravasamento. Aspirar sempre para certificar-se de não puncionar vasos.

b) Antraciclinas (Daunorrubicina, Epirrubicina e Doxorrubicina)
- Antídoto: Bicarbonato de sódio 8,4% + Dexametasona 4mg/ml
Preparo e administração: em uma seringa de 10ml preparar: 5 ml de bicarbonato de sódio 8,4% + 1 ml de dexametasona 4mg/ml, dividido em 6 injeções subcutâneas (agulha 13 x 4,5) em torno do local de extravasamento. Aspirar sempre para certificar-se de não puncionar vasos.
- Antídoto: Dimetilsulfóxido (DMSO) 50% gel
Ação: Absorção do solvente organosulfuroso, através da aplicação tópica, aumentando a permeabilidade e facilitando a absorção da medicação extravasada.
Preparo e administração: Aplicação tópica de 8/8 horas por 7 dias + compressa fria

c) Carnustina (BCNU)
Antídoto: Bicarbonato de sódio 8,4%
Preparo e administração: em uma seringa de 10ml preparar: 5 ml de bicarbonato de sódio 8,4%; dividido em 5 injeções subcutâneas (agulha 13 x 4,5) em torno do local de extravasamento. Aspirar sempre para certificar-se de não puncionar vasos.

d) Oxaliplatina
Antídoto: dexametasona
Preparo e administração: Não é recomendado aplicação subcutânea ou intradérmica na área do extravasamento. É preconizado o uso de Dexametasona 8mg, via oral, duas vezes ao dia, por 14 dias.

1. Bonassa EMA. Enfermagem em terapêutica oncológica. 4º ed. São Paulo (SP): Atheneu; 2012.
2. Kreidieh FY, Moukadem HA, Saghir NSE. Overview, prevention and management of chemotherapy extravasation. World J Clin Oncol; 2016; 7(1):87-97.
3. Boulanger J et al. Management of the extravasation of anti-neoplastic agents. Rev. Support Care Cancer. 2015; 23:1459-1471.
4. Jackson-Rose J, et al. Chemotherapy Extravasation: establishing a national benchmark for incidence among Cancer Centers. Clin J Oncol Nurs. 2017; 21(4):438-45.
5. Matsui Y, et al. Evaluation of the predictive validity of thermography in identifying extravasation with intravenous chemotherapy infusions. J Infus Nurs. 2017; 40(6):367-74.
6. Melo JMA, et al . Prevenção e conduta frente ao Extravasamento de agentes antineoplásicos: scoping review. Rev Bras Enferm. 2020; 73(4):e20190008.
7. Fidalgo JAP, et al. Management of chemotherapy extravasation: ESMO-EONS Clinical Pratice Guideline. 2012; 23(7).
8. Uptodate https://www.uptodate.com/contents/extravasation-injury-from-chemotherapy-and-other-non-antineoplastic-vesicants?search=extravasation-injury-from-chemotherapy-and-other-non-antineoplasic-vesicants&source=search_result&selectedTitle=1~150&usage_type=default&display_rank=1
9. Melo JMA, et al. Prevention and conduct before the Extravasation of antineoplastic chemotherapy: scoping review. Rev Bras Enferm. 2020;73(4):e20190008.

Tabela 1: Classificação quimioterápicos

Classificação dos quimioterápicos de acordo com poder de toxicidade dermatológica
Classificação quimioterápicos

Tabela 2: Tratamento - parte 1

Classificação das drogas de acordo com toxicidade dermatológica e relação de antídotos e tratamento não farmacológico
Tratamento - parte 1

Tabela 3: Tratamento - parte 2

Classificação das drogas de acordo com toxicidade dermatológica e relação de antídotos e tratamento não farmacológico
Tratamento - parte 2

Tabela 4: Tratamento - parte 3

Classificação das drogas de acordo com toxicidade dermatológica e relação de antídotos e tratamento não farmacológico
Tratamento - parte 3

Fluxograma 1: Fluxograma Extravasamento Quimioterápicos

Fluxograma Extravasamento Quimioterápicos
Fluxograma Extravasamento Quimioterápicos