Protocolos transfusionais III: transfusão de plaquetas

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Orientar o médico sobre a indicação e a prescrição de plaquetas

Flávia Leite Souza Santos
Ana Cristina Silva-Pinto

Data da última alteração: segunda, 08 de julho de 2024
Data de validade da versão: quarta, 08 de julho de 2026

1. Características do concentrado de plaquetas

O concentrado de plaquetas (CP) pode ser obtido por centrifugação do sangue total, ou por aférese de um único doador. A unidade CP convencional produzida por centrifugação do sangue total doado deve conter pelo menos 5,5 x 1010 plaquetas e seu volume é de 40-70 mL. Essas unidades, conhecidas como “plaquetas randômicas”, são agrupadas em uma única bolsa formando um “pool de plaquetas”, que em geral corresponde a 6 unidades de CP obtidos por doação convencional. O CP obtido por aférese de um único doador deve conter número superior a 3,0 x 1011 plaquetas em um volume de 200-300 mL. Atualmente as plaquetas estão disponíveis no HCFMRP como pool de plaquetas ou como aférese de plaquetas, sendo excepcional o uso de unidades randômicas. O armazenamento do CP é mantido em temperatura ambiente (22 ± 2ºC) em leve agitação horizontal contínua. A validade do CP é de apenas 5 dias.

2. Indicações

A principal indicação clínica para a transfusão de plaquetas é o controle de sangramento secundário à plaquetopenia por diminuição da produção na medula óssea ou ainda nas plaquetopatias congênitas. Em pacientes com trombocitopenia e hemorragia ativa é em geral recomendada a transfusão para manter a contagem acima de 50.000/mm3. Para hemorragias oftalmológicas, cerebrais, pulmonares ou associadas à coagulação intravascular disseminada ou transfusão maciça, o nível pretendido é de 100.000/ mm3.
A transfusão profilática de plaquetas pode ser indicada para pacientes com contagens plaquetárias inferiores a 10.000- 20.000/mm3, ou inferiores a 30.000-50.000/mm3 antes de procedimento invasivo ou associadas a coagulação intravascular disseminada (CIVD).

Consulte a Tabela 1 para algumas condições específicas em neonatos e crianças.


3. Contraindicações

A transfusão de CP não está indicada para pacientes com plaquetopenia secundária à destruição periférica das plaquetas (hiperesplenismo, plaquetopenia imune, púrpura trombocitopênica trombótica), exceto para controlar hemorragia grave ou precedendo procedimentos invasivos. Estas condições clínicas requerem outro tipo de intervenção (ex: esplenectomia, corticoterapia, plasmaférese terapêutica, etc.).

4. Dose

- A dose é determinada pelo diagnóstico, pela situação clínica e pelo peso do paciente.
- Uma unidade de CP obtido por aférese (CPAF) ou 1 pool de 6 unidades de CP convencional equivalem a uma dose terapêutica em adultos.
- Em pacientes pediátricos, 5 a 10ml/Kg é suficiente para aumentar a contagem plaquetária em 50.000 a 100.000/mcl.

5. Modo de administração

Sugere-se que a transfusão do CP em pacientes estáveis sem hemorragia ativa seja prescrita em 30 minutos. O médico deve avaliar individualmente cada paciente quanto ao risco de sobrecarga volêmica. Na presença de fatores de risco, pode-se aumentar o tempo de infusão ou ainda prescrever diurético endovenoso no início da transfusão. Na presença de hemorragia e na transfusão maciça a transfusão é feita em pinça aberta.


6. Transfusão de plaquetas e compatibilidade ABO

Prefere-se transfundir CP do mesmo tipo ABO do receptor (ABO isogrupo), porém, na ausência deste hemocomponente, é possível realizar a transfusão de plaquetas ABO não idêntico. Em pacientes sem refratariedade plaquetária, opta-se por respeitar a compatibilidade plasmática ( escolher em ordem de preferência a plaqueta que não contenha anticorpos, ou contenha menos anticorpos contra os antígenos ABO do receptor). Nessa situação, portanto, a prioridade de escolha segue a Tabela 2. A agência transfusional do HCFMRP segue a ordem de preferência descrita na Tabela 2, considerando também a disponibilidade de cada tipo ABO em estoque.

7. Transfusão de plaquetas RhD positivo em paciente RhD negativo

Deve-se evitar a transfusão de CP RhD-positivo em pacientes RhD negativo do sexo feminino com idade inferior a 45 anos. Neste último caso, se as plaquetas transfundidas forem RhD-positivo e a paciente não possuir anticorpo anti-D (não é aloimunizada), deve-se administrar 300 µg de imunoglobulina anti-D intramuscular, até 72 horas após a transfusão. Em crianças pequenas do sexo feminino a dose pode ser reduzida para 150mcg. No caso de nova exposição à CP RhD positivo, a dose deve ser repetida apenas após 6 semanas, ou antes disso se o anticorpo passivo (anti-D da imunoglobulina) não for mais detectado na triagem de anticorpos irregulares.


8. Refratariedade à transfusão de plaquetas

Várias condições clínicas podem interferir com o rendimento transfusional plaquetário. O próprio sangramento ativo, CIVD, infecções, febre e esplenomegalia são causas não imunes de refratariedade à transfusão de plaquetas. O uso concomitante de algumas medicações como a anfotericina e a vancomicina também interferem no rendimento da transfusão, de modo que o horário da administração deve ser distante da transfusão. A refratariedade imune representa 20% dos casos de refratariedade e está associada na maior parte dos casos à aloimunização contra antígenos HLA classe I, expressos nas plaquetas. A refratariedade imune é mais comum em pacientes não imunossuprimidos e em mulheres multíparas. Na presença de refratariedade, as transfusões profiláticas devem ser evitadas. Havendo suspeita de refratariedade imune, o serviço de hemoterapia deve ser comunicado ( agência transfusional ou hemocentro) para orientação e, se possível, prosseguir com a investigação e busca por doadores compatíveis. Para maiores detalhes, ver protocolo específico.

Vide definição acima.

Vide definição acima.

Vide definição acima.

Manual de Medicina Transfusional 2a Edição, Atheneu, 2014. Dimas Tadeu Covas, Eugênia Maria Amorim Ubiali.
AABB Technical Manual , 20th Edition

Tabela 1: Tabela 1. Indicações de transfusão de plaquetas em neonatos e crianças mais velhas


Tabela 1. Indicações de transfusão de plaquetas em neonatos e crianças mais velhas

Tabela 2: Tabela 2. Prioridade de seleção de CP de acordo com o sistema ABO para pacientes não-refratários


Tabela 2. Prioridade de seleção de CP de acordo com o sistema ABO para pacientes não-refratários