Manejo inicial:
O atendimento inicial na sala de urgência deve seguir o Fluxograma 1.
Medidas terapêuticas gerais:
• Posicionamento da cabeça: Posição neutra com cabeceira do leito elevada a 30 graus para facilitar a ventilação, melhorar a drenagem venosa do segmento cefálico e a reabsorção liquórica.
• Sonda nasogástrica ou orogástrica (na suspeita de fratura de base de crânio) em drenagem.
• Sonda vesical de demora para monitoração rigorosa da diurese.
• Sedação e analgesia:
o Manter infusão EV contínua de midazolam (0,1-0,3 mg/kg/h) e fentanil (1-3 mcg/kg/h), pois a dor e o estresse aumentam o metabolismo cerebral e a pressão intracraniana, favorecendo o dano cerebral secundário. Alternativamente, pode-se utilizar dexmedetomidina (0,2-1 mcg/kg/h) associada ao fentanil (1-3 mcg/kg/h).
o Antes de procedimentos dolorosos e aspiração de cânula endotraqueal administrar bolus adicionais de midazolam (0,1-0,2 mg/kg) e fentanil (1-2 mcg/kg).
• Bloqueio neuromuscular: pode ajudar a controlar a elevação da PIC por promover redução na pressão de vias aéreas e intratorácica, facilitando o retorno venoso cerebral e prevenir tremores e assincronia entre paciente e respirador. As drogas mais utilizadas são:
o Vecurônio: 0,1 mg/kg EV em bolus e 1-10 mcg/kg/min em infusão contínua.
o Rocurônio: 1 mg/kg EV em bolus e 5-10 mcg/kg/min em infusão contínua.
• Manejo hidroeletrolítico:
o O objetivo é minimizar o edema cerebral que ocorre após o trauma, mas com o cuidado de manter a volemia normal, garantindo perfusão tecidual adequada. Deve-se manter a concentração plasmática de Na+ maior ou igual a 140 mEq/L e a glicemia normal (70-110 mg/dL), pois a hiponatremia agrava o edema cerebral, e hipo e hiperglicemia se associam à lesão neuronal.
o Volume do soro de manutenção: inicialmente, administra-se 50-70% do volume calculado pela regra de Holliday-Segar, mas ajustes devem ser feitos de acordo com o balanço hídrico.
o Composição do soro de manutenção: glicose 0-2 g/kg/dia, Na+ 150 mEq/L, K+ 20-40 mEq/L e Ca++ 2 a 4 mL/kg/dia de gluconato de cálcio a 10% (máximo 80 mL/dia), de acordo com as concentrações plasmáticas. Evitar o uso de soluções hipotônicas que podem exacerbar o edema cerebral.
o Tratar hiponatremia agressivamente: se Na+ < 135 mEq/L, fazer correção rápida com salina hipertônica (NaCl 3% 5 mL/kg, em 20-30 minutos) e diurético (furosemida), quando indicado. Em serviços em que não se dispõe de NaCl 3%, deve-se diluir a solução de NaCl 20% 1:7, ou seja, adicionando-se uma parte de NaCl 20% a 6 partes de água destilada, transformando-a em solução a aproximadamente 3%.
• Suporte nutricional: introdução precoce de nutrição enteral, assim que houver estabilidade hemodinâmica e mobilidade adequada do trato gastrintestinal (idealmente, em 24-48 h). Se houver impossibilidade do uso da via enteral após 48 h, iniciar nutrição parenteral.
• Protetor gástrico: omeprazol 1-2 mg/kg/dia, EV.
• Cuidados respiratórios: manter oxigenação e ventilação adequadas, com PaO2 > 70 mm Hg, saturação > 94% e PaCO2 entre 35 e 38 mm Hg.
• Monitoração invasiva da pressão arterial: instalar cateter arterial para monitoração da pressão arterial média (PAM), coleta de exames e cálculo da pressão de perfusão cerebral (PPC = PAM – PIC):
o Manter PPC em torno de 50 mm Hg. Evitar valores de PPC menores que 40 mm Hg.
o Utilizar drogas vasoativas para aumentar a PAM e otimizar a PPC, se necessário:
־ Norepinefrina (0,01-1 mcg/kg/min).
• Controle da temperatura:
o Manter temperatura esofágica entre 36,5 e 37 oC.
o Tratar hipertermia agressivamente com antitérmicos e resfriamento com colchão térmico e bolsas de gelo.
• Anticonvulsivantes: administração profilática de fenitoína aos pacientes com contusão cerebral e hemorragia subaracnóidea.
o Ataque: 20 mg/kg.
o Manutenção: 5 mg/kg/dia.
Tratamento da Hipertensão Intracraniana
• Manter a PIC < 20 mm Hg. As medidas para o controle da PIC incluem:
• Drenagem de líquido cefalorraquidiano se cateter intraventricular instalado para monitoração da PIC.
• Hiperventilação:
o Não fazer hiperventilação profilática.
־ A hiperventilação prolongada é prejudicial, pois causa isquemia cerebral e se associa a aumento da morbi-mortalidade.
o A hiperventilação aguda deve ser utilizada no manejo de emergência da deterioração neurológica aguda, com sinais de herniação e elevações acentuadas da PIC.
• Osmoterapia:
o Solução salina hipertônica (NaCl 3%) 5 mL/kg EV em 20-30 minutos ou 0,1 a 1 mL/kg/h por infusão contínua. Manter osmolaridade plasmática < 360 mOsm/L.
o Manitol 20% 0,25 a 1 g/kg, em 20 minutos. Manter osmolaridade plasmática < 320 mOsm/L.
־ O objetivo é manter normovolemia com hiperosmolaridade. A escolha do agente hiperosmolar (salina hipertônica vs. manitol) deve levar em consideração o estado hemodinâmico do paciente. Na presença de instabilidade cardiovascular, deve-se dar preferência à salina hipertônica, em virtude do efeito diurético do manitol.
• Diurético não osmótico: furosemida associado ao manitol.
• Coma barbitúrico: utilizado em casos de hipertensão intracraniana refratária à terapêutica inicial.
o Iniciar somente se o paciente estiver hemodinamicamente estável.
o Tiopental: ataque de 5 mg/kg em 30 minutos, manutenção de 1-5 mg/kg/h. Desmame gradual após 24 – 48 h do controle da PIC.
• Hipotermia: atualmente, não há evidências que suportem o uso de hipotermia terapêutica em crianças com TCE visando melhor desfecho neurológico. A hipotermia moderada pode ser usada em casos de hipertensão intracraniana refratária às outras medidas de manejo clínico.
• Craniectomia descompressiva:
o Indicada em casos de hipertensão intracraniana refratária ao tratamento clínico.
o Deve ser feita precocemente (de preferência, nas primeiras 24 a 48 h após o trauma).