Emergências Clínicas - Delirium na Sala de Urgência

Área: Unidade de Emergência / Subárea: Clínica Médica

Discutir a melhor forma de prevenção e/ou abordagem de estado confusional agudo no pronto atendimento.

Tássia Cristina Monteiro. Médica assistente da Divisão de Emergências Clínicas do Departamento de Clínica Médica da FMRP/USP
Daniel Ossamu Goldschmidt Kiminami. Médico residente da Divisão de Geriatria do Departamento de Clínica Médica da FMRP/USP

Data da última alteração: terça, 06 de dezembro de 2022
Data de validade da versão: sexta, 06 de dezembro de 2024

Definição
Delirium ou Estado Confusional Agudo é caracterizado por uma alteração cognitiva de início agudo (geralmente de horas a dias), curso flutuante ao longo do dia e distúrbios da consciência, atenção, orientação, memória, pensamento, percepção e/ou comportamento. Um distúrbio de consciência e cognição alterada são componentes essenciais do delirium.
É considerada emergência clínica e se correlaciona a um agravamento do prognóstico do paciente, aumento da morbidade em curto prazo, períodos mais prolongados de hospitalização, maior taxa de institucionalização e maiores taxas de mortalidade.
A incidência eleva-se com a idade, déficit cognitivo prévio, fragilidade, gravidade da doença e comorbidades. Setores de emergência, unidades de cuidados intensivos e setores de pós-operatório apresentam as maiores taxas de delirium, sendo locais estratégicos para o diagnóstico e manejo precoce dessa condição.

Quadro Clínico
Clinicamente, pode ocorrer na forma hiperativa, hipoativa ou mista e cerca de 30% dos pacientes idosos apresentam delirium em algum momento durante a internação. Na forma hiperativa é predominante a agitação e confusão, algumas vezes com agressividade e risco de auto e heteroagressão; na forma hipoativa, o paciente apresenta-se com nível de consciência rebaixado, geralmente apático, prostrado, sonolento e pouco contactuante. A forma hipoativa, que com frequência passa despercebida mesmo entre os profissionais de saúde, se associa com pior prognóstico. Pode ocorrer ainda a forma mista, com alternância entre os dois pólos.
(Tabela 5)

O diagnóstico de delirium é clínico, realizado por meio de história clínica bem definida e exame físico minucioso (Tabela 1).
Deve-se avaliar se há mudança em relação à funcionalidade e ao nível cognitivo prévio do paciente, bem como questionar o uso de medicações (mudanças recentes de doses ou tipos), de álcool e de outras substâncias.
O exame físico deve incluir exame neurológico detalhado, também buscando distinguir entre síndromes neurológicas focais que podem imitar delirium.
A condição de delirium na maioria das vezes é multifatorial, assim como boa parte das síndromes geriátricas. Em alguns casos pode ser estabelecido por fator isolado, mas é mais comum ocorrer em associação com outros fatores precipitantes e fatores predisponentes (Tabelas 2 a 4). Além disso, os efeitos dos diversos fatores de risco tendem a ser cumulativos. A intervenção nesses fatores é necessária e consideravelmente eficaz para determinar a resolução do quadro.

Exames laboratoriais devem ser guiados pela avaliação clínica do paciente, sendo esta individualizada em cada caso. Normalmente incluem eletrólitos séricos, função renal, glicemia, hemograma completo, exame de urina I e urocultura, RX tórax, ECG e gasometria arterial.
Exames toxicológicos devem ser feitos quando houver indicação pela história clínica, assim como busca ativa por sinais de sepse grave.
A necessidade de exame de neuroimagem, líquor e eletroencefalograma ainda não é consenso, sendo apenas indicada quando a causa permanece obscura após os testes de rotina.
Caso haja sinais ou sintomas sugestivos de doença neurológica com sinais localizatórios, esses pacientes deverão ser submetidos a exame de imagem com urgência (tomografia de crânio).
O Confusion Assessment Method (CAM) é um instrumento desenvolvido para o rastreamento de delirium, não se prestando a avaliar a gravidade do quadro (Tabela 6).

Quando a causa base responsável pelo delirium é identificada, a terapia específica direcionada para essa condição é o meio mais adequado de reverter o quadro clínico.
Restrições físicas devem ser utilizadas apenas como último recurso, para proteção do paciente, visto estarem associadas frequentemente a aumento da agitação e complicações outras, tais como perda de mobilidade, úlceras por pressão, aspiração e prolongamento do delirium.
Tratamento farmacológico deve ser reservado aos pacientes com agitação mais grave, ou que estejam em risco em relação à própria segurança, de outros pacientes e da equipe médica. Deve-se estar ciente de que qualquer droga usada no tratamento do delirium causará efeitos psicoativos, podendo piorar ainda mais o estado mental do paciente. Por este motivo, deve-se usar a menor dose, pelo menor período possível.
A classe dos neurolépticos é a preferida para o tratamento, sendo o haloperidol o agente mais utilizado e adequado. Benzodiazepínicos devem ser evitados para o tratamento de delirium, exceto em casos de abstinência alcoólica ou quando os medicamentos neurolépticos são contra-indicados.
(Tabela 7)
Prevenção do delirium:
A prevenção primária é a melhor estratégia a ser utilizada para evitar o surgimento de delirium. Já foi demonstrada a efetividade de tais medidas, conseguindo-se redução de até 40% do risco em idosos hospitalizados.
Medidas eficazes para prevenir delirium incluem evitar, sempre que possível, fatores conhecidos por causar ou agravar o quadro, com auxílio de protocolos de orientação, intervenções ambientais e não farmacológicas preferencialmente. Medicamentos profiláticos (inibidores da colinesterase ou agentes antipsicóticos) não foram conclusivamente demonstrados como eficazes na prevenção de delirium.

Uma vez instalado, o delirium pode exigir semanas ou meses para sua resolução completa. Tais episódios podem afetar negativamente o curso de comorbidades graves e incapacitantes, como doença de Alzheimer.
(Fluxograma)

1. Delirium / RR Lôbo, SRB Silva Filho, NKC Lima, E Ferriolli, JC Moriguti. Revista Medicina (Ribeirão Preto) 2010; 43(3): 249-57.
2. Delirium in elderly people / SK Inouye, RGJ Westendorp, JS Saczynski. Lancet 2014; 383: 911-22.
3. Delirium in older persons / SK Inouye. N Engl J Med 2006; 354(11): 1157-65.
4. Emergências clínicas: abordagem prática / Herlon Saraiva Martins, et al. -- 8. ed. rev. e atual. -- Barueri, SP: Manole, 2013.
5. ©2015 UpToDate®.

Tabela 1: Cirtérios Diagnósticos para Delirium

Critérios Diagnósticos para Delirium
Cirtérios Diagnósticos para Delirium

Tabela 2: Fatores de risco para o desenvolvimento de delirium


Fatores de risco para o desenvolvimento de delirium

Tabela 3: Fatores reconhecidos como precipitantes de delirium


Fatores reconhecidos como precipitantes de delirium

Tabela 4: Lista de medicações que podem provocar delirium

Medicações que provocam Delirium
Lista de medicações que podem provocar delirium

Tabela 5: Apresentação clínica do delirium


Apresentação clínica do delirium

Tabela 6: Escala para avaliação do delirium: Confusion Assessment Method (CAM)


Escala para avaliação do delirium: Confusion Assessment Method (CAM)

Tabela 7: Tratamento farmacológico do delirium


Tratamento farmacológico do delirium

Fluxograma 1: Fluxograma básico para manejo do delirium na emergência


Fluxograma básico para manejo do delirium na emergência